A Teoria de Gaia e a Doutrina da Terra Viva - Ciência | Intérprete Nefita

A Teoria de Gaia e a Doutrina da Terra Viva

Uma abordagem teológica e científica à doutrina e teoria científica de que a Terra vive.


Por Luiz Botelho 31 de Maio de 2021
A Teoria de Gaia e a Doutrina da Terra Viva

Dentre os muitos aspectos únicos da teologia Mórmon, encontra-se a abordagem a nosso planeta não apenas como o local criado e escolhido para a execução do Plano de Salvação para os filhos que aqui vivem, mas a ideia de que a Terra é um organismo vivo e possuidor de um espírito.

As escrituras indicam que todas as coisas físicas foram anteriormente criadas espiritualmente. [1] Joseph Fielding Smith ensinou que "Os espíritos do homem, bestas, e toda forma animal existia antes que a fundação da Terra estivesse projetada, e são entidades vivas."[2] A doutrina e escrituras dA Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, entretanto, vai além ao ensinar que a própria Terra é uma entidade viva e inteligente, além da matéria fragmentada e individual presente nela.

Na visão de Enoque presente em Moisés 7:48 a própria terra se manifesta sobre a condição dos que nela habitavam dizendo:

E aconteceu que Enoque olhou a Terra; e ele ouviu uma voz que vinha de suas entranhas, dizendo: Ai, ai de mim, a mãe dos homens; estou aflita, estou fatigada por causa da iniquidade de meus filhos. Quando descansarei e serei purificada da imundície que saiu de mim? Quando me santificará o meu Criador, para que eu descanse e a retidão permaneça sobre minha face por algum tempo?

O lamento da Terra, então, persuadiu Enoque a clamar ao Senhor que ele tivesse misericórdia da Terra e dos poucos habitantes justos presentes nela. Nesse contexto, o destino do planeta é colocado lado a lado ao destino de seus habitantes, novamente sugerindo que nosso mundo é mais do que uma rocha vagando no espaço. O relato de Enoque associado à história de Noé trouxe ainda à teologia SUD a elaboração da ideia do dilúvio como sendo uma espécie de batismo da terra, tenha sido esse evento global ou local.

A doutrina da Terra viva, entretanto, possui raízes mais velhas do que as escrituras que abertamente faz menção dela e não é única da Igreja de Jesus Cristo. O monge Benedictine monk Basilius Valentin, entre outros, que viveu no século quinze afirmou:

"A Terra não é um corpo morto, mas é habitada por um espírito que é a sua vida e alma. Todas as coisas criadas, incluíndo minerais, absorveram sua força do espírito da Terra."[3] O ensinamento foi reafirmado por Brigham Young, um dos principais disseminadores da teoria dos Blocos de Edificação do Universo, que ensina que toda e qualquer criação de Deus consiste de 2 elementos primordiais, matéria inanimada e inteligências, que não são criações de Deus, mas entidades co-eternas com Deus o qual servem como um dos ingredientes necessários para toda a criação. Um artigo elaborado sobre a teoria dos Blocos de Edificação do Universo pode ser encontrado CLICANDO AQUI.

Brigham Young afirmou:

Há vida em toda a matéria, através da vasta extensão de toda a eternidade; Está presente nas rochas, na areia, na poeira, na água, ar, gases, e em toda a descrição e organização de matéria, seja ela líquida, sólida ou gasosa. [4] 

Outras passages nas escrituras se referem à Terra como obediente à lei que ela recebeu, cumprindo assim o propósito de sua criação.[5]

Embora vista por muitos no mundo como um conceito metafórico, a teoria de Gaia tem no decorrer dos séculos ganhado adeptos no campo da teologia, filosofia e mais recentemente da ciência.

A Teoria de Gaia--como descrita pela ciência e nomeada pelos Gregos-- foi formulada por James Lovelock e consiste na ideia de que "todos os organismos e seus arredores inorgânicos na Terra estão intimamente integrados de maneira a formar um sistema único e auto-regulado."[6]

A teoria propõe que o conjunto de aspectos físicos individuais presentes na biosfera terrestre tem um papel direto em determinar a estabilidade da vida do planeta, como a temperatura, clima, salinidade dos oceanos, oxigênio na atmosfera, o que gera a possível implicação de que a Terra como um todo seja um organismo vivo. 

Apesar de soar abstrato a primeira vista, o conceito está mais presente em nossas vidas do que imaginamos. Nosso próprio corpo contém literalmente bilhões de formas de vida independentes, como células e bactérias, que regulam o funcionamento de todos os aspectos de nossa vida. A existência independente dessas entidades vivas não anulam a existência independente de nossa consciência como a entidade "que age" sobre todo o corpo. A teoria de Gaia propõe algo similar para a Terra (o que as vezes me faz pensar que se a Terra é viva e possui um espírito e um corpo físico, nossa espécie seria o equivalente a um vírus presente nela, destruindo, utilizando recursos, multiplicando-se e repetindo.)

Embora a descrição da Teoria de Gaia tenha diferenças e similaridades de um ponto de vista teológico, filosófico ou científico, todas elas são unânimes em nos alertar de nossa responsabilidade moral de zelar por nosso planeta e seus recursos. O historiador Theodore Roszak sugeriu em sua obra The Voice of the Earth que a ideia disseminada de que "não temos nenhuma obrigação ética para com nosso planeta" constitui uma "psicose social",[7] algo que nos relembra que é impossível ao discípulo de Jesus Cristo professar seu amor pelo criador e ao mesmo tempo olhar com descaso para sua criação.

Referências:

[1] Moisés 3:4-5, 9
[2] Joseph Fielding Smith, Doctrines of Salvation, 3 vols., compiled by Bruce R. McConkie (Salt Lake City: Bookcraft, 1954), 1:62.
[3] T. C. McLuhan, The Way of the Earth: Encounters with Nature in Ancient and Contemporary Thought (New York: Simon & Schuster, 1994), 21.
[4]  Brigham Young, 23 March 1856, Journal of Discourses, 26 vols. (London and Liverpool: LDS Booksellers Depot, 1854-86), 3:277.
[5] D&C 88:18-19, 25
[6] The Gaia Hypothesis, Harvard University. Link: https://courses.seas.harvard.edu/climate/eli/Courses/EPS281r/Sources/Gaia/Gaia-hypothesis-wikipedia.pdf
[7] Theodore Roszak, The Voice of the Earth (New York: Simon & Schuster, 1992), 14, 308–9.



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